quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

A psicologia e a doença renal crônica

matéria retirada do site http://www.prorim.org.br/site/artigos/ver/i/12  por: Claudia Tavares Ruggi



O enfrentamento das incapacidades e perdas geradas pela doença crônica: um estudo de portadores de insuficiência renal crônica em hemodiálise. 

O tratamento hemodialítico constitui-se em recurso terapêutico bastante difundido no tratamento da insuficiência renal crônica. A avaliação do processo de adoecimento do paciente renal crônico a partir de seu próprio convívio com a doença e tratamento hemodialítico identificou que estes pacientes utilizam estratégias de enfrentamento que envolvem “esforços intrapsíquicos”, “voltar-se para os outros” e também a “ação direta”, em decorrência das perdas e incapacidades geradas pela doença (perda do poder físico, perdas sociais, econômicas, sexuais, perda da liberdade e privacidade). 

Constatou-se que não é fácil, tanto para o paciente como para os familiares, “habitar” ou conviver com uma doença crônica (a insuficiência renal crônica), que se caracteriza atualmente por um curso demorado, podendo ser progressiva, eventualmente fatal ou resultar em diversos prejuízos, requerendo tratamentos dialíticos prolongados, rigorosos, freqüentes e dispendiosos, facilitando sentimentos de impotência, desânimo generalizado e sensação permanente de ameaça à integridade corporal do paciente. 

Além disso, o tratamento hemodialítico evoca uma questão paradoxal para o paciente: como um tratamento pode ser tão desprazeiroso? Acresce-se a questão da desinformação o que aumenta os efeitos ansiogenos gerados pela vivência da doença e do tratamento aos pacientes. 

Assim, verificou-se neste estudo que o doente renal crônico luta para entender e aceitar sua doença, procurando incansavelmente, através de estratégias de enfrentamento, compreender a doença e seu respectivo tratamento. 

A atual tendência da Psicologia e das ciências voltadas para a área da saúde é considerar o homem como um ser no mundo, dentro de uma perspectiva holística que integre três esferas biológica, psicológica e social, que são interdependentes e só podem ser compreendidas uma em função da outra.

Assim, o profissional de saúde deveria pensar no doente como um ser humano dotado de corpo e alma e que naquele momento de sua vida necessita de cuidado pessoal e especial. Nesse sentido, o apoio psicológico no tratamento do paciente portador de insuficiência renal crônica é um aspecto fundamental em todo o programa terapêutico eficaz e humano, tendo em vista as múltiplas situações difíceis e ameaçadoras que esse paciente atravessa na vivência da doença.

O psicólogo que atua no hospital geral trabalha com o ser doente, que a todo momento procura resgatar sua essência de vida, interrompida pela ocorrência do fenômeno doença. Além disso, firmada na posição humanística de especial atenção aos pacientes e familiares, o psicólogo hospitalar considera a pessoa humana em sua globalidade e integridade, única em suas condições pessoais, com seus direitos humanamente definidos e respeitados.

Deste modo, o psicólogo que atua na unidade de diálise procura ser o intermediário psicológico, buscando atingir a compreensão das relações entre profissionais, entre profissionais/pacientes e profissionais/família, pois muitas vezes a angústia ou a depressão do paciente renal crônico refere-se à destruição do corpo, sofrimento, invalidez, medo do tratamento hemodialítico, gerando, então, dificuldades na relação médico - paciente. Além disso, deve-se considerar a história de vida do paciente como referencial para suas atitudes de enfrentamento e relações.

O psicólogo junto ao paciente portador de insuficiência renal crônica em tratamento hemodialítico deve procurar investigar a vivência do doente, identificando o que se passa na consciência deste a partir do momento em que passa a conviver com uma doença crônica, através de uma relação envolvente, empática e flexível, visando um encontro real e se afastando da postura impessoal que permeia o atendimento psicológico clínico tradicional.

A assistência psicológica na unidade de diálise busca o alívio emocional do paciente como também de seus familiares. Nesse sentido, o psicólogo tem como função entender e compreender o que está envolvido na queixa, no sintoma e na patologia, para ter uma visão ampla do que está se passando com o paciente renal crônico, para que possa auxiliá-lo no enfrentamento desse difícil processo, bem como dar à família e à equipe de saúde subsídios para uma compreensão melhor do momentum de vida da pessoa enferma.

Assim, o psicólogo como membro da equipe de uma unidade de diálise tem, que observar e ouvir com paciência as palavras e silêncios, já que este profissional é quem mais pode oferecer, no campo da terapêutica, a possibilidade de confronto do paciente com sua angústia e sofrimento na fase de doença e tratamento, buscando superar os momentos de crise.

O atendimento psicológico na unidade de diálise tem ainda como finalidade vivenciar junto ao paciente renal crônico seus conflitos frente a sua nova condição de ser, escutando suas experiências, despojando-se dos condicionamentos e predisposições inerentes da condição humana. Nesse atendimento, o psicólogo poderá avaliar o grau de comprometimento emocional causado pela doença e pelo tratamento, proporcionando condições para que o paciente possa desenvolver ou manter capacidades e funções não prejudicadas pela doença.

Assim, ao favorecer ao paciente a expressão de seus sentimentos sobre a doença e tratamento, situações por sí só mobilizadoras de conflito, o psicólogo facilitará também a ampliação das estratégias adaptativas do paciente, neutralizando ou minimizando o sofrimento inerente ao ser e estar doente com insuficiência renal crônica.